A apresentação célere de pessoas presas em flagrante a um juiz é um direito essencial, previsto em documentos internacionais como o Pacto de San José da Costa Rica (1969) e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (1976), ambos ratificados pelo Brasil em 1992. Esses tratados refletem o compromisso global com a proteção dos direitos humanos, inclusive daqueles que se encontram sob custódia do Estado, sejam presos provisórios ou definitivos.
Com o intuito de alinhar o sistema de justiça brasileiro a esses compromissos internacionais, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) deu início, em 2015, ao projeto da audiência de custódia, inicialmente em colaboração com o Tribunal de Justiça de São Paulo e o Ministério da Justiça. A iniciativa foi posteriormente consolidada pela Resolução nº 213 do CNJ, estabelecendo que todo indivíduo preso deve ser apresentado a um magistrado no prazo máximo de 24 horas.
Foi somente em 2019, com a sanção da Lei nº 13.964/19 — o chamado “Pacote Anticrime” — que a audiência de custódia passou a constar expressamente no Código de Processo Penal, regulamentada nos artigos 287 e 310.
Desde sua implementação, o impacto da medida tem sido significativo. Segundo dados do sistema BNMP 3.0 do CNJ, mais de 2 milhões de audiências foram realizadas em todo o país. Os registros mostram que 59% das prisões foram mantidas, 41% resultaram em liberdade e 0,3% em prisão domiciliar, evidenciando o papel fundamental da audiência de custódia na análise da legalidade das prisões e na aplicação adequada de medidas cautelares.
Outro ponto crucial da audiência é a possibilidade de identificar casos de tortura ou maus-tratos cometidos durante a prisão. Dados apontam que 7% das audiências registraram denúncias desse tipo, o que representa aproximadamente 153 mil relatos.
Os números revelam que a audiência de custódia tem promovido avanços relevantes para a humanização do processo penal brasileiro, contribuindo para a redução de prisões arbitrárias e fortalecendo o contato direto entre o magistrado e o custodiado, o que favorece uma análise mais justa e individualizada da situação.
Para marcar os 10 anos do projeto, o CNJ prepara o lançamento de uma nova versão do painel BNMP 3.0, com dados inéditos sobre o perfil dos autuados e informações detalhadas sobre as audiências. Também está previsto um evento com a apresentação de orientações técnicas voltadas à qualificação dos magistrados, visando a promoção de boas práticas, inovação e aperfeiçoamento contínuo do instituto.
O futuro da audiência de custódia depende da colaboração entre os diversos atores do sistema de justiça — juízes, promotores, defensores e advogados — e do contínuo investimento em capacitação. Com isso, será possível aprimorar ainda mais esse instrumento, que representa uma das maiores evoluções na proteção da liberdade individual e da dignidade da pessoa humana no Brasil contemporâneo.
